segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Pedais épicos: Il Passo de Maniva


Il grave ciclista 
Um Pedal muito épico. Um candango contra a montanha. Il Passo de Maniva, Bréscia, Itália. 15 de Julho de 2014. Provavelmente vou esquecer de algum detalhe, já faz um tempinho. Bom, o plano familiar inicial era de visitar a irmã da minha esposa lá em Botticino (esse mesmo do mármore) e por consequência algumas outras cidades por perto. Eu, ciclista sério, logo que a ideia de ir pra lá surgiu abri o Strava pra analisar o que tinha por perto e meu queixo caiu com força. Estávamos indo para muito perto dos Alpes! Muito perto de onde o Giro de 2014 passou, muito perto de várias montanhas. Só não chorei de emoção porque não conseguia decidir por qual subida ia chorar, eram muitas! Então, incluí na pauta do planejamento 3 dias de aluguel de bicicleta no passeio. Muito feliz pela aprovação, comecei a buscar em lojas locais. Com ajuda da minha cunhada, achei a "Il ciclista di Sirmione", linda loja do Ruffini Mauro e de sua esposa (muito figura) Salvadorenha. Fomos buscar a Giant tcr
La machina
numa tarde na belíssima cidade de mesmo nome da loja, dessa vez com grande ajuda do Giordano. O primeiro teste foi numa grande subida dentro da cidade, a Maddalena di Brescia de Categoria 1. Era domingo, saí umas 10 da manhã com sol forte já. De primeira fiquei impressionado com o número de ciclistas nas ruas! Dezenas de nós! Foram 10 km com 7% de inclinação média. Como bom ciclista sério, não tirei nenhuma foto do meio da subida, só lá em cima. Emoção forte a cada "tornante", as curvas de 180° ladeira acima. O visual da cidade ficando mais baixa, as encostas e as pernas ardendo. Consegui manter dentro de uma zona "confortável", doendo pero no mucho. Me senti um Nairo Quintana enquanto passava ciclistas locais. Cumprimentava o pessoal, mas raramente via um sorriso, não sei se pelo meu péssimo sotaque italiano ou se o pessoal lá era muito sério também. Eu estava de turista bobo, sorria pra tudo. Pensando bem, se passasse um gringo por mim sorrindo eu iria ficar chateado também. No finzinho cheguei na roda de um local, e com toda falta de educação, ataquei no último quilômetro e cheguei sozinho lá em cima. Tive alguma noção ao chegar lá no topo e não fazer a clássica comemoração de braços abertos, seria muito ridículo. 44'41" de escalada, 13,5 km/h de média e principalmente confiança pra tentar uma subida maior ainda, o plano inicial era o Monte Campione!

Percurso completo com altimetria

   O Monte Campione fica a uns 70 km da casa onde estávamos, e ainda teria que escalar mais 15 km. Não era uma ideia muito boa, iria demorar demais. Mas estava confiante de cobrir os cerca de 160 km no dia. Porém, mais uma vez me ajudando muito, Giordano sugeriu ir até a estação de esqui de Passo de Maniva, 60 km já com a escalada. Me pareceu muito mais sensato. Planejamento refeito, percurso no GPS e às 7:40 da manhã italiana, ponho o pé na estarda. E que estrada! Logo após sair de Bréscia já dá pra sentir o drama, montanhas altíssimas e um vale muito estreito, por onde serpenteia a estrada até Maniva.

      Em Gardone Val Trompia o vale se estreita e o rio que acompanha a estrada acelera. A inclinação do terreno já começava a aumentar. Até aí estava tentando manter a média perto de 28 km/h pra não demorar muito, mas eu desisti da idéia. Não é Brasília, que a subida logo termina, ainda restavam 35 km de subida.
Google street view. Não tirei uma foto
   Eu não me recordo onde exatamente foi, mas passei por um ciclista numa Montain Bike. Tentei o tradicional "Bongiorno" e tradicionalmente não recebi como resposta um sorriso ou um aceno de volta. O cara veio na roda e me passou alguns instantes depois. Demorei 10 segundos pra decidir se ia junto ou ficava de boa... Fui junto. Foi uma forçada desnecessária, mas ser ultrapassado por uma MTB, não rola. Dei um tempo na roda dele e passei de novo. Por sorte o cara saiu da estrada pra trilha dele. Ainda falou alguma coisa que não entendi. Acenei de volta e voltei ao ritmo, ufa.

   Que o lugar é lindo e maravilhoso, que dá vontade de chorar enquanto eu estou relembrando o pedal e que voltaria lá mais 8 mil vezes é chover no molhado. A partir de San Colombano a coisa começa a ficar ainda mais bonita e feia ao mesmo tempo. O segmento marcado a partir dessa cidade é de Categoria 1 com 9,2 quilômetros de distância e 8% de inclinação média - para nós candangos, é dureza. A cada "tornante" era uma lágrima de alegria no olho direito e outra de dor no esquerdo. Fiz uma paradinha rápida pra pegar água em uma bica. Bem rápido pra não perder a coragem e pra ver se conseguia curar um pouco da câimbra que começava a dar sinais. Uma placa indicava que o lugar havia sido construído durante a grande guerra. Infelizmente não registrei a parada...


Pois é... No paredão final, onde leio no asfalto "ultimo quilômetro" minha perna direita falhou miseravelmente. Câimbra doída, não teve conversa, travou! Consegui parar numa "tornante" sem cair. E gravei esse vídeo:

 Alguma coisa eu registrei! E por último, mas não menos importante, esse:


Doeu pra chegar lá em cima. E lá, finalmente levantei a cabeça para apreciar a vista. Que pedal magnífico! Montanhas de verdade! Eu, escalador sério! Aí sim, pausa pra um espresso, um pé de moleque italiano de amêndoas, uma obrigatória Coca-Cola e vamos à descida!

Sim, tinha que descer de lá. 60 quilômetros ladeira abaixo, "haaaaja santo, meu amigo!" diria um comentarista.
Alto...
As primeiras "tornantes" foram tensas e geladas. Até San Colombano fui sozinho, depois disso um pequeno caminhão de gás seguia à minha frente. O motorista conhecia o caminho, aproveitei o batedor e o segui tranquilo. Só tinha que frear bem pra não ultrapassá-lo nas curvas. Fomos juntos uma boa parte da descida.

Chegando próximo à Bréscia, deu câimbra novamente na mesma perna. Estava a uns 15 km de Botticino, sem comida e quase sem água e sem vontade de arriscar um "Ita-porto-inglês" pra comprar algum lanche. E já tinha demorado bastante. Consegui chegar são e salvo e muito feliz.

Agradeço muito aos nossos anfitriões, Carla e Giordano, a paciência e apoio da minha família e ao Ciclista de Sirmione e sua esposa pela Bici!

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